Indígenas, quilombolas,
ciganos, pessoas em situação de rua e catadores estão em risco de insegurança
alimentar.Quase duas décadas de combate à fome fazem do Mesa Brasil Sesc um dos
mais importantes programas solidários no Ceará.
42% dos cearenses vive com
menos de R$ 420 reais por mês, de acordo com a Síntese de Indicadores Sociais
de 2019, relatório anual do IBGE que analisa as condições de vida da população
brasileira. O baixo poder de compra dessas pessoas e rendimento domiciliar per
capita as inclui na classificação de pobreza, categoria compreendida pela ONU
como um estado de privação.
A alimentação é um dos fatores
mais limitados pela renda insuficiente, o que pode as colocar em situação de
insegurança, não conseguindo acesso a comida em quantidade e qualidade
necessárias. É para estas pessoas que o Programa Mesa Brasil Sesc atua
incansavelmente há dezenove anos no intuito de apresentar uma resposta
institucional no combate a forme e ao desperdício de alimentos.
Em meio a situações de
calamidade, a escassez e vulnerabilidade se agravam, portanto, desde o início
da pandemia em março, até 24 de abril, o Sesc arrecadou 316 mil quilos de
alimentos (316 toneladas) e cadastrou instituições em caráter emergencial para
que as doações chegassem aos grupos sociais mais suscetíveis à fome durante o
isolamento social, como as populações tradicionais e pessoas em situação de
rua.
O histórico de atuação desse
programa é bem mais abrangente e já registra mais de 48 milhões de quilos
destinados a população vulnerável no Estado, desde sua implementação. Todos os
anos, a rede solidária que a instituição organiza faz chegar alimentos a mais
de 280 mil cearenses, coletando doações de empresas e distribuindo para as 480
instituições sociais.
Presente em todo o País, o
Mesa Brasil Sesc tem a meta de arrecadar cerca de 40 milhões de quilos
anualmente, recebendo colaboração significativa do Ceará, um dos maiores bancos
de alimentos do País. O Estado contribui com cerca de 7% do montante nacional,
aproximadamente 3 milhões de quilos distribuídos todos os anos,com ampliação
prevista para 5 milhões em 2020.
“O nosso banco de alimentos
faz toda a diferença na rede do Sesc, é considerado um dos pioneiros, foi o
terceiro a ser criado no Brasil e, desde então, nós nunca paramos de buscar
doadores e de atender instituições do Estado ”, afirma Regina Miranda, gerente
e uma das fundadoras do Mesa Brasil Ceará.
Em 2001, ano em que o banco de
alimentos iniciou suas atividades no território cearense, 21% da população do
Estado vivia com o equivalente a meio salário mínimo e o rendimento médio era
de 334 reais (SIS/IBGE), inferior ao atual.
No contexto nacional, o índice
de extrema pobreza chegava a 17,5% (IPEA), foi em meio a esse cenário que o
então presidente da Fecomércio Ceará, Luiz Gastão Bitencourt, encabeçou a
campanha Amigos do Prato, que em 2003 foi transformada em uma rede nacional de
solidariedade atualmente chamado de Programa Mesa Brasil Sesc, com bancos de
alimentos ativos em todo o território nacional.
A logística já era semelhante
à ao modelo atual: mobilizar os empresários a doar o excedente da produção para
a causa social, mantendo um estoque de alimentos que complementaria as
refeições preparadas por creches, escolas, instituições de longa permanência,
casas de recuperação, casas de apoio, associações comunitárias, projetos
sociais e organizações não governamentais que atuam nos bolsões de pobreza na
Capital e Interior.
Em 2014, o Brasil foi retirado
do Mapa da Fome, devido aos programas sociais do Governo Federal e apoio da
sociedade civil organizada. “O Mesa Brasil fez e está fazendo a sua parte. No
Estado do Ceará estamos distribuindo uma média de 300 toneladas de alimentos
por mês e fazendo uma grande diferença no aporte alimentar das famílias do
Estado”, afirma Regina.
Atualmente, os bancos de
alimentos ficam sediados em Fortaleza, que atende a Capital e Região
Metropolitana; na cidade Sobral com abrangência para a Região Norte, em Iguatu
que atende o Centro-Sul do Estado e em Juazeiro do Norte e Crato que abastecem
as instituições do Cariri.
No Ceará, cerca de 80% dos
alimentos doados são de hortifruticultura. O excedente da colheita de
produtores rurais em todas as regiões é coletado para doação. Há também
doadores individuais, como os permissionários da Centra de Abastecimento do
Ceará (Ceasa), distribuidoras, e pequenas empresas.
Um dos doadores mais antigos é
a Agrícola Formosa, que produz frutas e legumes para exportação, há mais de dez
anos a empresa faz doações regulares ao Programa. Com sede na cidade de Icapuí,
a empresa tem fazendas espalhadas pelo Ceará e Rio Grande do Norte, sendo a
maior produtora de melões e melancias do Brasil e uma das maiores do mundo. Das
safras de frutas e legumes, uma parte sempre é destinada ao banco de alimentos
do Sesc, e, mesmo que a pandemia esteja acontecendo em período chuvoso de
entressafra, apenas neste mês, o grupo doou 30 toneladas de abóbora. “A empresa
já doou uma quantidade razoável”, explica o vendedor João Batista Rodrigues.
Urgência na pandemia
De acordo com Regilvânia
Mateus de Araújo, membro Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional
do Ceará, tanto o Consea, como o
Conselho de Direitos Humanos, consideram em situação mais crítica na pandemia
as pessoas nas áreas de risco de periferias urbanas, os catadores de material
reciclável, pessoas em situação de rua, famílias de agricultores, família das
pessoas encarceradas, migrantes, povos tradicionais, como os indígenas,
quilombolas e povos de terreiro.
Para eles, a carência de
alimentos já era uma realidade antes, e piora neste contexto de isolamento
social, quando não podem sair para conseguir sustento. “São dívidas históricas,
acúmulos de violações de direitos em segurança alimentar há muito tempo”,
afirma Regilvânia.
Com mediação da ONG Caritas,
da qual ela faz parte, o Mesa Brasil conseguiu cadastrar 14 associações de
catadores de material reciclado em Fortaleza e enviar doações de alimentos para
370 catadores, suas famílias e comunidades.
Também em caráter emergencial,
o Mesa Brasil integrou associações comunitárias de povos quilombolas, ciganos,
de terreiro. Apoiando a Associação Ame Bem, foram destinados alimentos para 150
pessoas em situação de rua em Fortaleza.
Em período normal, o Programa
doa alimentos para instituições sociais, que preparam as refeições para as
pessoas que atendem, mas no momento de urgência foi preciso abranger novos
métodos. “Nesse momento de pandemia, tivemos que cadastrar instituições que atendem
famílias, a gente entrega a doação para as entidades e elas entregam para as
famílias”, explica a gerente do Mesa Brasil Ceará, Regina Miranda.
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