Durante a epidemia do novo
coronavírus, 36% dos idosos brasileiros que ainda trabalham ficaram sem
rendimentos ou tiveram grande diminuição na renda. E entre aqueles que não
possuem vínculo empregatício, esse número sobe para 55%. Estas são algumas
conclusões da ConVid - Pesquisa de Comportamentos, coordenada pela Fiocruz, que
tem buscado investigar como a Covid-19 tem afetado a vida dos brasileiros.
Mais de 45 mil pessoas
participaram da pesquisa, no período de 24 de abril a 24 de maio, respondendo a
um questionário online. Os primeiros resultados da análise já foram divulgados,
e apontam para questões como o aumento de problemas relacionados à saúde mental
da população. Os dados obtidos por essa primeira etapa foram analisados pelo
Grupo de Informação em Saúde e Envelhecimento (Gise) da Fiocruz, que agora
apresentam alguns pontos importantes relativos às pessoas com 60 anos ou mais.
Os idosos representam 20% daqueles que responderam o questionário.
Os cientistas indicam, por
exemplo, como é alto o percentual de idosos que tinham trabalhos remunerados
antes da epidemia: 52,3%. “Assim, não seria correto afirmar que os idosos
representam uma população dependente. O último censo já havia apontado que os
rendimentos de pessoas com mais de 60 anos são essenciais para cerca da metade
da renda dos domicílios brasileiros”, alerta Dalia Romero, coordenadora do Gise
e integrante da equipe da pesquisa ConVid.
Infográfico: Icict/Fiocruz
Em geral, a seguridade social
diminui com a idade: 42% dos idosos trabalham sem vínculo empregatício. Entre
as mulheres a desvantagem é maior: 49%, ou seja, uma a cada duas idosas que
trabalha não tem vínculo formal. Entre os homens, o percentual é de 37%.
“Os idosos não apenas sofrem
maior risco ante a Covid-19 em si, como também pelo enfraquecimento da
seguridade social na fase de vida em que mais precisariam de proteção. O
impacto negativo da epidemia na renda domiciliar afetará ainda a alta proporção
de domicílios que dependem da força de trabalho dos idosos”, explica a
pesquisadora.
Muitos em atividades
essenciais
Dalia defende que, além de
fortalecer os mecanismos de proteção econômica dos idosos, é fundamental
reforçar o isolamento social para toda a população, e não apenas para grupos
considerados de risco. “É necessário que haja políticas sociais, o governo não
pode perder de vista a importância de aliar a manutenção do isolamento à
garantia de suporte econômico, já que muitos idosos sustentam suas famílias.
Eles não podem ser obrigados a ir para a rua, isso é mandá-los para a morte,
especialmente em cidades como o Rio de Janeiro, que tem sérias deficiências na
atenção básica e de assistência social”, alerta.
O percentual de idosos que
exerce alguma atividade considerada essencial (assistência à saúde, segurança,
transporte, serviço bancário etc) é de 34%, dentre o total dos que trabalham
durante a epidemia. Entre as mulheres, esse percentual é de 37%.
Em relação à intensidade da
restrição do contato com as pessoas, os pesquisadores verificaram que, entre os
idosos, aqueles que exercem atividades essenciais fizeram menos isolamento que
os demais: 42% apenas reduziram um pouco o contato social.
Resultados da ConVid mostram
também que, a cada 10 domicílios, quatro têm pelo menos um morador idoso.
Dezoito por cento deles moram sozinhos. “Assim, o isolamento social de todos e
a rede de assistência social e de atenção básica é fundamental para garantir a
saúde de toda a população. Cuidar do idoso é cuidar de todos, é cuidar do
país”, destaca Dalia.
Cuidadores também são
vulneráveis
No Brasil, cuidadores de
idosos também estão em situação de muita vulnerabilidade ante a epidemia. Os
dados da pesquisa mostraram que em 56% dos domicílios em que havia um idoso
assistido por um cuidador, o profissional continuou trabalhando durante a
pandemia. Esse percentual é 76% nos domicílios de maior renda per capita. “Na
maioria das vezes são mulheres pobres as responsáveis por esse cuidado, sem
direitos formais. E depois do trabalho elas voltam para casa, em territórios
cujas condições aumentam a vulnerabilidade”, reforça a pesquisadora da Fiocruz,
lembrando que cuidadores de idosos são enquadrados na categoria de empregados
domésticos, não sendo reconhecidos como categoria ocupacional.
A pesquisadora aponta que
cerca de 500 mil domicílios brasileiros (8%) têm idosos com restrição das
atividades cotidianas, ou seja, que precisam de ajuda. E, em 28% desses casos,
essa ajuda é dada por um cuidador. Um quadro que aproxima duas fatias da
população com grande vulnerabilidade no contexto da pandemia: idosos que muitas
vezes vivem sozinhos e necessitam de cuidados, e mulheres pobres que precisam
sair de casa e se expor para garantir o sustento da família.
“O SUS é universal, é preciso
que a população rica e a classe média lute também para que a atenção básica e a
saúde da família chegue a todos. Mulheres pobres, muitas delas negras, precisam
preservar a vida e ficar em casa. Para isso, precisam de assistência social
eficiente”, completa Dalia Romero.
Os resultados do estudo estão
dentro de uma amostra de 45.161 indivíduos que participaram da ConVid no
período de 24 de abril a 24 de maio de 2020. A investigação é coordenada pelo
Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict/Fiocruz), em parceria com
a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade Estadual de Campinas. A
amostra da ConVid foi calibrada por meio dos dados da Pesquisa Nacional de
Amostra por Domicílios (Pnad, 2019) do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) para obter a mesma distribuição por Unidade da Federação,
sexo, faixa etária, raça/cor e grau de escolaridade da população brasileira. A
pesquisa segue em andamento.
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